O Ensino Integrado e a Pedagogia da Alternância

Foto: Alunos do Curso Técnico em Agropecuária Integrado ao Ensino Médio, em Regime de Alternância do IFNMG-Campus Almenara no VI Seminário de Iniciação Cientifica do IFNMG

Formação Integral

A dimensão omnilateral da  Pedagogia da Alternância

A formação integral pelo trabalho

Na Pedagogia da Alternância o trabalho produtivo não é o mesmo que emprego. O trabalho é compreendido do ponto de vista histórico e ontológico, numa relação permanente entre vida e escola. Portanto, é vinculada aos princípios e finalidades da educação profissional e tecnológica, isto é, “a articulação com o mundo do trabalho e os segmentos sociais, e com ênfase na produção, desenvolvimento e difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos” (BRASIL/MEC, 2008). Tem-se de um lado o trabalho e o mundo da produção e seus saberes permeados pela vida social, econômica, cultural e ambiental onde o estudante está inserido, e, do outro, a escola com suas atividades curriculares e extracurriculares.

Na formação em Alternância, “não há aluno, mas ator socioprofissional, no sentido de que o estudante deve se tornar ativo no processo educativo” (BEGNAMI, 2018 p. 122). Como metodologia pedagógica, ela é “pautada em uma organização curricular integradora exige reorganizar os tempos e espaços educativos” (BRASIL, MEC, SEB, DICEI, 2013 p.226). A formação integral do estudante se percebe no “exercício de uma primeira responsabilidade no mundo produtivo (…) possibilitando-lhe obter recursos iniciais que lhe proporcionem autonomia e possibilidades de contribuição solidária com a sua família” (CALVÓ E GIMONET, 2014 p. 54).

Imagem: Pilares da Pedagogia da Alternância. Adaptado de Gimonet (2007).

A formação integral do estudante na Pedagogia da Alternância se constrói concomitantemente com o modo de viver do campo, mais especificamente a partir do trabalho. É respeitada a cultura, a identidade, e os saberes tradicionais do campesinato a fim de manter viva a história e a memória dos povos trabalhadores do campo. As mediações didáticos-pedagógicas potencializam o processo formativo da Educação do Campo “que permitem a interação do jovem com o conhecimento escolar e sua realidade” (MOCELIN, 2016 p. 51).

No currículo integrado contextualizado na Pedagogia da Alternância, os saberes escolares integrados com os saberes comunitários e familiares são como que embalados para serem integrados às disciplinas técnicas e propedêuticas. Os diferentes espaços e tempos de formação, integrados e alternados, são articulados quando da aplicação dos instrumentos didáticos-pedagógicos específicos em um único e orgânico currículo. 

O eixo integrador gira, como que numa engrenagem, toda a energia da intelectualidade da consciência humana no estudante, na família e na comunidade  com suas instâncias políticas e técnicas. Juntos e conscientes dos problemas e necessidades locais ambicionam “um ousado e complexo projeto de desenvolvimento territorial, integrador dos valores locais, nacionais e internacionais” (NOSELLA, 2013 p. 102). 

Imagem: Rede de relações na Pedagogia da Alternância. Adaptado de Calvó & Gimonet (2014).

Tem-se uma formação que dá primazia à sabedoria, à experiência e aos problemas locais. A família e a comunidade são convidadas a participar com voz ativa na formação do estudante (GIMONET, 2007), por sua vez, o currículo tem como eixo integrador o compromisso social do estudante para que este contribua ativamente com o fortalecimento e desenvolvimento dos arranjos produtivos, sociais e culturais locais em parceria com a escola e a comunidade. 

A experiência comunitária contém o reservatório ou “cadinho” de saberes que darão suporte formativo do estudante e significa o ponto de partida para o processo formativo significativo; devendo, portanto, anteceder o tempo-espaço escola. (GIMONET, 2007 p. 29) Os saberes ou conhecimentos comunitários tradicionais integram o reino da liberdade ao reino da necessidade quando da articulação do “trabalho produtivo moderno e os exercícios didáticos” na integração curricular.  Portanto, nas mediações didáticos-pedagógicas utilizados na Pedagogia da Alternância  tem-se a fórmula mais adequada da formação pelo trabalho e “está assim lançada uma proposta original da formação omnilateral” (NOSELLA, 2013 pp. 100-101).

O trabalho como princípio educativo

O Ensino Médio Integrado tem o reconhecimento da dimensão ontológica e histórica do trabalho como ponto de partida para a produção de conhecimentos e de cultura. É o primeiro fundamento da educação como prática social (RAMOS, 2003; RAMOS, 2007). É nessa etapa da Educação Básica que se deve deixar claro para os adolescentes e jovens como o trabalho se relaciona com a existência humana e do planeta,  e como seu sentido foi alterado através dos tempos, transformando-se em força produtiva e categoria econômica. 

Além do ponto de vista do unitário no diverso, o projeto unitário de Ensino Médio se preocupa com a categoria trabalho no processamento do conhecimento, e não somente com o processamento de pessoas, cujo aspecto amplia as desigualdades sociais. Os aspectos do trabalho se concentram na perspectiva unitária dos sentidos sócio-históricos em meio ao diverso que constitui o tecido social.

Foto: Alunos do Curso Técnico em Agropecuária Integrado ao Ensino Médio, em Regime de Alternância preparando apresentação de trabalho científico no VI Seminário de Iniciação Científica do IFNMG – Campus Almenara

Por sua vez, o trabalho repercute nas normas de comportamento dos indivíduos numa sociedade, alterando-se representações, comportamentos e significados que determinam a cultura de grupos humanos.  Reconhece-se, portanto, os dois sentidos do trabalho: o sentido ontológico e o sentido histórico. Os sentidos do trabalho são vistos em sua unicidade.

sentido ontológico entende que o ser humano humaniza-se através do trabalho. E assim, produz a sua existência quando da sua ação sobre a natureza, adaptando-a a si. Na sua relação com outros homens e com a  natureza o homem produz conhecimento, que é resultado da busca da compreensão e transformação dos fenômenos. Quando legitimado pela sociedade, o conhecimentos torna-se ciência (RAMOS, 2010).

De acordo com Souza Júnior (2007), os sentidos dos conhecimentos têm a explicação da sua gênese na ontologia do ser social, pois “toda a ciência é ligada às necessidades, à vida, à atividade do homem (…) sendo os conhecimentos produtos do trabalho” (SOUZA JÚNIOR, 2007 p. 130). Corroborando com Souza Júnior (2007), Kosik (1969) entende que o trabalho é uma atividade vital à existência humana e imprescindível ao conhecimento e à sociabilidade.

“Cada grau do conhecimento humano sensível ou racional, cada modo de apropriação da realidade, é uma atividade baseada na práxis objetiva da humanidade e, portanto, ligada a para chegar a ser verdadeiramente homem (o homem se forma evoluindo-se em homem) e conhecer a realidade como tal” (KOSIK, 1969 p. 22).

Como atividade ontológica, o trabalho explica-se no entendimento de como o homem faz a representação da realidade, assim como no modo que ele manifesta a materialidade da representação que ele idealiza de modo a produzir a sua existência apropriando-se e transformando a natureza e a si mesmo.

Já o sentido histórico reconhece o trabalho do ponto de vista capitalista: um fator econômico e uma práxis produtiva. O Capital transformou a “atividade criativa e criadora do trabalho a um conjunto de tarefas” (RAMOS, 2003 p. 10). O trabalho humano torna-se trabalho assalariado; uma forma peculiar da existência humana no mundo dominado pelo capitalismo. Neste sentido de trabalho os novos conhecimentos são criados a partir de outros que já existem, muitas das vezes baseados em necessidades criadas pelo próprio sistema capitalista dos meios de produção.

Segundo Ramos (2007), “Uma educação unitária pressupõe que todos tenham acesso aos conhecimentos, à cultura e às mediações necessárias para trabalhar e para produzir a existência e a riqueza social” (RAMOS, 2007 p. 1) E o que também hoje compreendemos por Ensino Médio Integrado, partindo do entendimento de três sentidos que o caracterizam: “como concepção de formação humana; como forma de relacionar ensino médio e educação profissional; e como relação entre parte e totalidade na proposta curricular” (RAMOS, 2007 p.3).

Imagem: Recorte de um Plano de Formação (Mediação Didático-Pedagógica da Pedagogia da Alternância) adaptado de Gimonet (2007).

A Escola Unitária e desinteressada é defendida pelo filósofo italiano Antonio Gramsci. A profissionalização do trabalho e o consequente utilitarismo da educação objetivaram o adestramento da classe trabalhadora para poderem ser “instruídos para um ofício, sem ideias gerais, sem cultura geral, sem alma, mas só com o olho certeiro e a mão firme” (GRAMSCI, 1975 p. 67).

Escola Unitária e desinteressada reflete o processo de formação integral humana. Tem como base a concepção de cultura na historicidade que configura a estrutura que molda uma sociedade. Tem uma proposta curricular de formação intelectual plena, que objetiva o entendimento dos fenômenos que permeiam a cultura no desenvolvimento do mundo social e material, e a própria ciência no contexto da compreensão de conceitos que integram o processo histórico de construção do conhecimento.

Esse sentido de integração “expressa uma concepção de formação humana, com base na integração de todas as dimensões da vida no processo formativo” (RAMOS, 2007 p. 3). Caracteriza-se pela inclusão, no currículo do Ensino Médio, de “valores éticos-políticos e conteúdos históricos e científicos que caracterizam a práxis humana” (RAMOS, 2007 p. 5), integrando estes à educação para o exercício de profissões técnicas.

Tem o trabalho não alienado como princípio educativo, permeando ciência e cultura incorporados aos objetivos e métodos de projeto de escola unitária no contexto que justifica a formação específica para atividades diretamente produtivas, porém visando atender às necessidades e às características sociais, culturais, econômicas e intelectuais da pessoa em formação. (RAMOS, 2003). 

“Na Alternância não há aluno, mas ator socioprofissional, no sentido de que o estudante deve se tornar ativo no processo educativo” (BEGNAMI, 2018 p. 122).

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